Uma avaliação de três políticas sociais do governo detectou falhas e irregularidades, como pagamento a pessoas falecidas, baixa focalização nas populações mais vulneráveis e desvios de finalidade. Os problemas foram identificados no abono salarial (espécie de 14.º salário pago a trabalhadores formais que ganham até dois salários mínimos), no Minha Casa Minha Vida (hoje, Casa Verde e Amarela) e no Programa Nacional de Alimentação Escolar (Pnae).
Os diagnósticos foram feitos pelo Conselho de Monitoramento e Avaliação de Políticas Públicas (Cmap), formado por Ministério da Economia, Casa Civil e Controladoria-Geral da União (CGU), e são os primeiros a serem divulgados de um total de 16 incluídos em 2020 para análise do colegiado.
Detectados os problemas, o grupo fez uma série de recomendações e os órgãos responsáveis terão 60 dias, a partir da notificação, para entregar um plano de ação. Na prática, nenhuma orientação poderá ficar sem resposta: os ministérios terão de apresentar propostas ou justificar por que agir seria inviável. O monitoramento será feito pela CGU e, quando envolver mudanças legais, também pela Casa Civil. Os resultados também serão levados ao Congresso.
“Não adianta fazer avaliação, e ela ficar na prateleira. Não é só ficar cumprindo tabela”, afirmou ao Estadão/Broadcast o secretário de Avaliação, Planejamento, Energia e Loteria do Ministério da Economia, Gustavo Guimarães. Ele afirma que é importante haver agora um comando constitucional, incluído este ano pela PEC emergencial, determinando a avaliação dos programas, mas ressalta que é preciso garantir sua execução.
Na avaliação do abono salarial, o grupo detectou pagamentos inadequados a trabalhadores que têm renda média superior a dois salários mínimos (considerando todas as fontes de renda do domicílio) ou que trabalharam menos de 30 dias no ano de referência. Também foram identificados repasses a pessoas falecidas, com CPF inexistente ou cancelado e a trabalhadores supostamente empregados por empresas baixadas ou inexistentes na base de dados da Receita Federal.
Outro problema do abono, segundo o conselho, é a falta de uma política clara. Segundo Guimarães, não se sabe hoje se o abono tem como foco a distribuição de renda, a redução da desigualdade ou o incentivo à formalização no mercado de trabalho. O programa hoje custa cerca de R$ 20 bilhões anuais.
Os dados apontam elevada concentração de beneficiários do abono nas faixas da população com renda mais elevada. Os 10% mais pobres, por exemplo, ficam com menos de 2% dos recursos. Já os 10% mais ricos recebem mais de 2%. Os dados consideram a renda domiciliar per capita dos beneficiários.
Uma das recomendações é explicitar o objetivo do abono e avaliar a criação de um limite máximo de renda familiar per capita para ter direito ao benefício. Seria necessário uma análise jurídica para saber se uma mudança como essa demandaria alterar a Constituição, ou poderia ser feita por lei. O governo já tentou fazer alterações no abono por meio de PEC, mas esbarrou na forte resistência de parlamentares.
Habitação
O grupo também apontou deficiências no programa Minha Casa Minha Vida. Segundo o colegiado, o uso apenas do critério de renda para definir os beneficiários da antiga faixa 1 do programa é insuficiente. Nesse trabalho, a CGU também detectou que 17,5% dos contemplados não vivem mais no imóvel, o que aponta falhas de fiscalização.
O colegiado apontou ainda que o programa habitacional falha ao não proporcionar acesso a oportunidades a seus beneficiários. Os empreendimentos do MCMV tiveram desempenho ruim na proporção de empregos formais acessíveis em caminhada de até 30 minutos em relação ao total de cada município, devido à larga distância dos grandes centros. O acesso a oportunidades para essas famílias beneficiadas é pior do que em favelas ou domicílios de baixa renda na maioria das cidades, segundo o relatório.
A recomendação do Cmap é que o governo trace um plano para destinar imóveis ociosos da União em grandes centros ao programa habitacional – uma medida que já tem sido cogitada pelo Ministério do Desenvolvimento Regional.
No Programa Nacional de Alimentação Escolar, que banca a aquisição de alimentos para a merenda escolar de 40,5 milhões de alunos, as falhas detectadas foram de focalização. Do orçamento de R$ 4,3 bilhões, 32% foram destinados a dar suporte aos estudantes de municípios e Estados que estão entre as 30% maiores receitas por aluno. No sentido inverso, as 30% menores receberam apenas 23%.
Para corrigir essa distorção, o conselho sugeriu redistribuir 10% dos recursos do programa (equivalente a R$ 430 milhões) aos municípios dos 30% mais pobres. Com isso, a fatia deles no Pnae aumentaria consideravelmente, de 23% para 39%.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
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