Operação deflagrada nesta terça-feira, 14, pelo Ministério Público do Estado de São Paulo (MP-SP) e a Polícia Social indicou que o Primeiro Comando da Capital (PCC) tem uma espécie de projecto de saúde informal para prestar atendimento a integrantes da subida cúpula da organização criminosa presos em diferentes unidades, uma vez que a Penitenciária 2 de Presidente Venceslau.

 

A investigação aponta que médicos e dentistas são contratados pela “Sintonia dos Gravatas”, que reúne advogados ligados ao PCC, para realizar diferentes tipos de procedimentos em faccionados presos. Os serviços incluem até procedimentos estéticos, uma vez que clareamento dental e botox. Entre os pacientes, estão nomes uma vez que Marco William Herbas Camacho, o Marcola.

Ao todo, oito pessoas que estavam nas ruas foram presas na operação desta terça. Entre elas, estão três advogados investigados por gavinha com o PCC, além de integrantes de uma organização não governamental (ONG) que seria usada para fazer denúncias falsas de abusos no sistema prisional. Os outros quatro alvos de mandados de prisão são detentos do sistema carcerário.

“O que a investigação aponta é que esse projecto de saúde, entre aspas, que nós identificamos, embora funcione no contextura da organização criminosa, não está disponível para todos”, afirmou o solicitador Edmar Caparroz, do Departamento de Polícia Judiciária do Interno (Deinter) 8, de Presidente Prudente. “Ele somente é atingível a uma fatia privilegiada da organização criminosa”, acrescentou.

A apuração indicou que os médicos e dentistas seriam contratados por advogados que representam o PCC. Os profissionais de saúde, porém, não estariam diretamente envolvidos com a partido.

“Não digo que os médicos e dentistas foram cooptados, porque estão prestando um serviço e são remunerados por isso”, disse o promotor de Justiça Lincoln Gakiya, do Grupo de Atuação Privativo de Combate ao Delito Organizado (Gaeco), do MP-SP. Segundo ele, se houver indícios de que houve envolvimento direto, os profissionais também serão implicados na investigações.

Entre os que já foram beneficiados nessa espécie de “tratamento vip”, estão nomes uma vez que Paulo César Souza Promanação Júnior, o Paulinho Neblina; Wanderson Nilton de Paula Lima, o Andinho; e Rogério Jeremias de Simone, o Gegê do Mangue, assassinado em 2018.

Marcola também figura na lista dos que já foram contemplados pelo esquema, embora uma reivindicação feita por ele há um tempo tenha sido indeferida.

Uma vez que mostrou o Estadão anteriormente, investigações do MP e da Polícia Social descobriram que o número 1 da partido criminosa pediu autorização duas vezes para colocar botox, no segundo semestre de 2015, para cuidar de sua aspecto, mas teve as solicitações negadas pela Justiça. A reportagem indica ainda que Marcola tinha um dermatologista pessoal que o atendia na Penitenciária de Presidente Venceslau 2 antes de ele ser transferido para o sistema federalista.

Uma vez que funciona esquema

A contratação dos médicos e dentistas é feita por advogados que integram a “Sintonia dos Gravatas”, em esquema que dura há pelo menos uma dez e oferece aos profissionais da saúde valores muito supra do mercado. A Polícia Social indicou ainda que os pagamentos eram feitos por meio de depósitos em nome de pessoas não identificadas previamente e até mesmo fracionados.

“Não é um setor (dos gravatas) que atende a todos os integrantes do PCC. Ele atende alguns integrantes que foram elencados pela Sintonia Final”, disse Gakiya. “Via de regra, aqueles que são atendidos foram presos em missão do PCC, seja por tráfico de drogas e armas, seja por envolvimento em atentados contra agentes públicos. Esses indivíduos têm recta, vamos expressar, ao atendimento VIP.”

Gakiya salienta que, conforma os termos da Lei de Realização Penal, se o recluso tem recta a qualquer atendimento que o Estado não pode prover, é recta dele reivindicar atendimento médico. “É verosímil que ele (recluso) use um atendimento médico específico para que faça isso, desde que tenha um pedido que é feito ao juiz corregedor para estabelecer mediação médica”, disse o promotor de Justiça. “Mas evidentemente não seria o caso de um atendimento estético.”

Uma vez que investigação começou

Uma vez que mostrou o Estadão, as investigações da Operação Scream Fake (Falso Grito, em tradução) começaram em 2021, quando um visitante da Penitenciária 2 de Presidente Venceslau tentou entrar na unidade com um pacote com drogas K (maconha sintética) e cartões de memória escondidos nas roupas. Ela foi presa em flagrante na idade.

“Nos cartões, havia diversos arquivos contendo pastas dos setores de saúde da partido, rol de médicos e dentistas, advogados com codinomes, além de um material da ONG, em que ela prestava conta à cúpula da partido”, disse o solicitador Edmar Caparroz.

Conforme o solicitador, a estudo dos cartões de memória foi medial para o progressão inicial das investigações. Os dados coletadas ganharam ainda mais sentido com a consumição de novos manuscritos em unidades prisionais nos anos seguintes, incluindo em 2023.

“Ali (no ano pretérito) foi onde nos causou bastante preocupação: neste novo manuscrito, o contexto trazia um orquestramento de manifestações, que deveriam ocorrer em todo o País, e, no contextura dessas manifestações, esse manuscrito sugeria que os presos simulassem tortura no envolvente prisional e inclusive sugeria a morte de três agentes públicos”, afirmou Caparroz. As autoridades disseram que não foram identificados quais agentes seriam esses.

Foram cumpridos 12 mandados de prisão preventiva e 14 de procura e consumição contra advogados e integrantes de uma ONG nas cidades de São Paulo, Guarulhos, Presidente Prudente, Flórida Paulista, Irapuru, Presidente Venceslau e Ribeirão Preto, além de Londrina, no Paraná.

A Ong Pacto Social & Carcerário São Paulo, branco da operação, teria sido criada sob demanda do PCC, passando a promover protestos e falsas denúncias a mando da partido, aponta a investigação. O esquema seria comandado por advogados ligados à partido.

“Eles (gravatas) não só coordenavam a contratação desses profissionais de saúde, para atender determinados presos, uma vez que também (faziam) a coordenação dessa ONG, que teoricamente era ligada aos direitos humanos e direitos dos presos”, disse Gakiya. “Ela absolutamente foi mantida e gerida pelo PCC para fabricar factoides, para fabricar denúncias falsas.”

Procurada, a seccional paulista da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) disse seguir a investigação e ressaltou “seu compromisso com a moral e a legitimidade”. Já os responsáveis pela ONG, que tem sede em São Bernardo do Campo, foram contatados pelas redes sociais e não deram retorno até a última atualização desta reportagem.