SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Um grupo de mulheres cientistas lança, nesta segunda-feira (19), a Rede Brasileira de Mulheres Cientistas em busca de impactar as políticas públicas em meio à pandemia da Covid-19.
“Somos cientistas, ainda sub-representadas nas universidades e nas instituições de pesquisa brasileiras, segundo dados do CNPq, e, neste momento tão dramático, que afeta inclusive as nossas produções científicas, buscamos atuar em defesa das mulheres a partir de uma perspectiva que busca a atenção a algo praticamente ignorado no debate público: a condição das mulheres brasileiras na pandemia”, consta na carta de intenções escrita pelo grupo.
Durante a pandemia, aumentaram os relatos de violências sofridas pelas mulheres –o que a carta sublinha. Mas, além dessa violência, de forma geral mais falada e explícita, há uma precarização geral, afirma Flávia Biroli, professora de Ciência Política da UnB e integrante da rede.
Um dos problemas mais graves da situação atual, diz Biroli, é a queda acentuada da participação feminina no mercado de trabalho, a menor em 30 anos, segundo dados do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada).
A Pnad Contínua, do IBGE aponta que 8,5 milhões de mulheres deixaram a força de trabalho no terceiro trimestre de 2020 (dado mais recente), na comparação com o mesmo período de 2019, ou seja, antes da pandemia. Com isso, mais da metade das mulheres com 14 anos ou mais ficaram fora do mercado de trabalho –a participação na força de trabalho era de 45,8%, queda de 14% em relação ao anos de 2019.
“Não podemos não interferir”, diz Biroli. Uma das ideias do grupo é agir com assessoramento técnico-científico junto a agentes públicos, pensando no legislativo e no poder municipal, principalmente ao se considerar que o poder federal, principalmente na figura do presidente Jair Bolsonaro (sem partido), tem muitas vezes ignorado o conhecimento científico disponível.
“Entendemos que existem caminhos diferentes. Um deles é a importância de dialogar com os gestores municipais, que estão na ponta. Muitas vezes, no caso deles, não falta vontade de atuar, mas pode faltar corpo técnico”, diz Biroli.
O Brasil não tem respondido adequadamente à pandemia, diz Karina Calife, médica sanitarista e professora da faculdade de medicina da Santa Casa de São Paulo e integrante da Rede de Brasileira de Mulheres Cientistas.
“A voz das mulheres cientistas que têm produzido nessa pandemia tem sido menos ouvida do que deveria ser”, afirma Calife.
Com isso, o grupo pretende ter um olhar especial para políticas públicas que podem ajudar nos problemas que as mulheres, inclusive a parcela significativa que faz parte dos profissionais de saúde, têm enfrentado, como emprego, moradia, alimentação adequada e saúde sexual e reprodutiva.
Na carta de lançamento, a rede também lembra da situação especialmente mais frágil das mulheres negras, pobres e moradoras de periferias. É citada ainda a atual condição sensível das mulheres grávidas, grupo que tem apresentado uma mortalidade no Brasil que chama a atenção em relação ao documentado no resto do mundo.
“Há uma ausência completa de políticas públicas voltadas a apoiar as mulheres e meninas neste momento de crise humanitária”, consta no documento. “É preciso exigir que o Estado brasileiro cumpra seu papel. E é preciso que cumpra seu papel a partir de uma perspectiva de gênero.”
Para dar prosseguimento a esse plano amplo de construir uma agenda efetiva relacionada à pandemia, só no boca a boca, o grupo já conta com pelo menos 1.500 pesquisadoras que assinaram a carta de intenções.
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